A diminuição da disponibilidade de crédito público tornou o mercado de capitais a melhor opção para a formação de capital de giro para muitas empresas de grande porte. Um dos maiores motivos para isso foram mudanças na política de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que aumentou a taxa de juros cobrada sobre o valor financiado, aproximando-se da praticada pelos bancos privados. A baixa dos juros, que tem tornado cada vez menos interessante para bancos privados emprestarem dinheiro para grandes empresas, também é outro fator que pode ter diminuído a quantidade de financiamento disponível e empurrado as empresas para mercados de capital.
A Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Anbima) divulgou no início de janeiro um relatório sobre as atividades referentes à 2019. A instituição mede a quantidade de capital tomado através de ações, títulos, IPOs, debêntures, e outras formas de crédito disponíveis no mercado de capitais. De acordo com a instituição, empresas conseguiram R$ 396.068 milhões através da emissão de títulos. Esse valor é o maior desde 2013, e representa um aumento de 59,25% em relação ao total de 2018. Grande parte dessa quantia foi conseguida através de debêntures (títulos da dívida das empresas), responsáveis por R$ 173.606 milhões. Outra parte desse valor foi utilizado para refinanciamento de dívidas (34,8%). Em último lugar ficou a utilização para criação de capital de giro (29,4%).
As ações também foram grande fonte de capital para as empresas. IPOs e títulos de empresas já listadas na bolsa anteriormente conseguiram levantar R$ 90.175 milhões segundo o mesmo relatório. Entre a destinação dos recursos, também está a criação de capital de giro, (10,5%), ainda aparecendo aquisição de ativos (34%) e aquisição de participação acionária (28,9%). As empresas que estão utilizando o mercado de capital para manter suas atividades não são novas. Um dos indicativos disso é a quantidade pequena de IPO em 2019, apenas cinco, se comparados com rodadas de captação por ações feitas por empresas que já tinham capital aberto (37).
Essa tendência para a troca de empréstimos de bancos pelo mercado de capitais já tinha sido apontada pelos pesquisadores do Centro de Estudos de Mercado de Capitais da Fipe (Cemec-Fipe). No início de 2019, a instituição lançou um relatório com dados de 2017 e 2018 que já apontava essa tendência com a diminuição de dinheiro vindo do BNDES e maior aporte a partir de debêntures, sejam elas no mercado financeiro ou para bancos. De acordo com o relatório, “até novembro (de 2018), o aumento de R$ 68,3 bi do saldo de recursos tomados no mercado doméstico se deve exclusivamente à captação liquida de R$ 79,1 bi com títulos de dívida corporativa, valor esse que supera a variação negativa de R$ 10,8 bi das fontes de crédito bancário”.
A troca fica ainda mais justificada se comparar as taxas de juros do BNDES apontadas no estudo com as cobradas para debêntures. “Na comparação com as condições oferecidas pelo BNDES, combina-se a forte queda da taxa de juros das debentures com a progressiva elevação das taxas médias das operações desse banco e da mudança de sua política operacional”, explicam os pesquisadores no relatório. A preferência citada se deu por alguns poucos meses quando a taxa para debêntures estava acima dos juros praticados pelo banco governamental. Em entrevista para o site G1, Carlos Antonio Rocca (coordenador do Cemec-Fipe), explicou o aumento do uso de mercados de capital a partir da redução de custo deles. “Com o governo pagando 14,25% (patamar que a Selic alcançou há alguns anos), quem quisesse colocar papel privado no mercado teria que oferecer um prêmio acima disso, então o custo de captação ficava muito alto. Com o desabamento da Selic, o custo de captação das empresas caiu drasticamente”.
Por mais que esse mercado esteja mais vantajoso do que captar recursos públicos, empresas podem encontrar dificuldades para entrar nele. A emissão de debêntures (assim como a venda de ações, regulada pela Comissão de Valores Mobiliários – CVM) tem diversas exigências para que as empresas abram seu capital. O processo é longo, mas com planejamento e sem pressa, é possível usufruir do mercado de capitais para conseguir financiamento.