O mercado de dívida corporativa é uma importante fonte de recursos para as companhias nacionais. Além de reduzir a dependência dos bancos, ele torna a concessão de crédito mais sustentável, pulverizando o risco entre diversos investidores e garantindo certa estabilidade em períodos de crise, quando o crédito bancário tende a escassear.
Os CRIs e CRAs são títulos emitidos para financiar atividades do setor imobiliário e do agronegócio. Quem pode emitir esses títulos são as companhias securitizadoras.
Elas convertem as dívidas originadas de negócios entre produtores rurais, cooperativas e terceiros, no caso do CRA, ou de transações no setor imobiliário, no caso do CRI, em um título lastreado em bens, como maquinário ou imóveis, ou em contratos de aluguel, por exemplo.
A securitizadora paga pelos recebíveis cedidos pela empresa e disponibiliza o título para negociação no mercado de capitais, normalmente, com o auxílio de uma instituição financeira. Assim, a empresa consegue antecipar o recebimento de seus recebíveis.
Os títulos são remunerados e tanto o valor dos juros como a periodicidade do pagamento são estipulados no momento da aplicação.
No atual cenário econômico – marcado pela perspectiva de baixo crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) e de inflação controlada –, a taxa básica de juros, a SELIC, se encontra no patamar mais baixo da história desde março do ano passado, em 6,5% ao ano. Diante das dúvidas sobre o desempenho de 2019, a tendência é que ela se mantenha no mesmo nível, ou seja reduzida ainda mais para estimular a economia.
Porém, sem acompanhar a queda expressiva da SELIC, iniciada em outubro de 2016, os juros praticados pelos bancos continuaram altos, tornando-se um empecilho ao investimento produtivo. Para as empresas, a taxa média das concessões no crédito livre estava em 19,9% ao ano, no último mês de abril, segundo dados do Banco Central. Ou seja, mais do que três vezes o valor da taxa SELIC.
Pelo lado dos investidores, sejam eles corporações ou pessoas físicas, os juros baixos favorecem a busca por aplicações de maior retorno. Investir em renda fixa pode favorecer a gestão do fluxo de caixa de empresas, pois garante maior previsibilidade das remunerações e amortizações dos títulos, além de oferecer um risco menor do que aplicações em renda variável.
Assim, ainda que os CRA’s (Certificados de Recebíveis do Agronegócio) e CRI’s (Certificados de Recebíveis Imobiliários) tenham uma oferta relativamente reduzida, eles oferecem uma rentabilidade maior do que a SELIC, que remunera os títulos públicos e serve de base para outras aplicações de renda fixa, como o CDB (Certificado de Depósito Bancário).
Por outro lado, quando as empresas se deparam com juros bancários altos, aumenta a necessidade de buscar alternativas para a captação de recursos, e o mercado de capitais é uma delas.
Através da emissão de títulos de dívida privada, como as debêntures, e de securitização, como é o caso dos CRA’s e CRI’s, as companhias conseguem financiar suas atividades a médio e longo prazo, seja para investimento fixo, alongamento do perfil de dívidas e até financiamento do capital de giro.
Nesse sentido, empresas que apresentam um fluxo de caixa estável tendem a oferecer menor risco de calote aos investidores e podem, por isso, pagar menos juros sobre os títulos emitidos.
Vejamos então como funciona a emissão de CRA e CRI, e o que tem acontecido recentemente em relação aos investimentos para entender melhor como atuar nesse filão do mercado de capitais.
Existem três maneiras de se remunerar os títulos de CRA e CRI.
A sua rentabilidade pode ser atrelada à inflação, cobrindo o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) e pagando mais uma taxa prefixada para garantir ganho de poder de compra ao investidor.
Pode estabelecer simplesmente uma taxa fixa para remunerar o título, independente do comportamento dos juros ou da inflação.
E pode ainda ser pós-fixada, pagando, por exemplo, uma porcentagem do CDI (Certificado de Depósito Interbancário).
Embora o diagnóstico em relação ao comportamento da SELIC seja válido principalmente para o curto prazo, pois persiste a sensação de instabilidade na economia brasileira por conta de fatores políticos e externos, identificou-se, desde o ano passado, uma mudança no perfil dos investidores, principalmente, em CRA.
Entre outros fatores, a permanência dos juros baixos fez com que investidores institucionais aumentassem sua participação de cerca de 10%, em 2017, para aproximadamente 30%, em 2018.
Antes, a maior parte dos investidores dessas aplicações era ligada às próprias ofertas, como as instituições que lideravam as emissões dos títulos ou estavam ligadas a elas, além de pessoas físicas.
Já em CRI, o aumento foi de cerca de 60% para 65%.
Embora as debêntures ainda sejam os instrumentos mais importantes de dívida privada em termos de volume e diversidade, os CRA’s tiveram o crescimento mais significativo nos últimos cinco anos, com média de 42% ao ano. Os dados são de um estudo da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) sobre o mercado de dívida corporativa no Brasil.
Nesse ano, o valor total das emissões domésticas no mercado de capitais somou R$ 93 bilhões, no acumulado de janeiro a maio, contra quase R$ 96 bilhões, considerando o mesmo período do ano passado.
Diante da queda de R$ 60 bilhões para R$ 53 bilhões emitidos em debêntures, na comparação para o mesmo intervalo, a emissão de CRA’s mais que dobrou, passando de pouco menos de R$ 2 bilhões, em 2018, para mais de R$ 5 bilhões, em 2019. Enquanto isso, a emissão de CRI’s se manteve praticamente estável em torno de R$ 2,5 bilhões, segundo relatório da Anbima (Associação Brasileira de Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais).
Por se tratar de crédito privado, o risco da aplicação em CRA e CRI é maior do que se comparado aos títulos da dívida pública, por isso, costumam pagar mais.
Eles também não contam com a proteção do FGC (Fundo Garantidor de Crédito), que assegura até R$ 250 mil ao investidor em caso de quebra da instituição financeira responsável.
Por isso, vale a pena observar a nota atribuída a esses títulos por agências de classificação de risco.
Outra desvantagem é que esse tipo de papel não é muito negociado no mercado secundário, o que reduz consideravelmente a sua liquidez.
Além disso, no caso dos papéis não atrelados à inflação, a desvalorização da moeda pode corroer a rentabilidade real das aplicações.
Por outro lado, pelo fato de a emissão ser feita em regime fiduciário, se a securitizadora tiver dificuldades financeiras, o pagamento aos investidores pode não ser afetado, pois os recebíveis ficam segregados do patrimônio da emissora.
Como sempre, é preciso avaliar com muito cuidado os benefícios e riscos envolvidos nesse tipo de operação financeira e levar em conta o plano de negócios da empresa para tomar a decisão de maneira consciente e estratégica.